É agosto na Vila Izabel
Agosto é o motivo pelo qual acredito em astrologia. Por muito tempo, achei esse negócio só uma seção da revista Capricho. Até conhecer sujeitos, muito mais inteligentes do que eu, que a tratam como coisa séria. Mesmo depois de ter participado de um bolão da mega-sena com eles, jogado na hora sugerida e hoje morando na Vila Izabel, e não em Londres, como me prometeram. Mas continuo lendo uns livros e redobro esforços neste mês.
Os incréus, que devem ter lido o primeiro parágrafo com um riso de deboche, que me tragam suas explicações racionais. Eu estou em busca de outras. Lá vai. Em 23 de agosto, nasceu Nelson Rodrigues, meu autor favorito. Em 24 de agosto, foi a vez do Borges, que briga com o Nelson pelo meu carinho. No mesmo dia, em Curitiba, foi a vez do Paulo Leminski, o cara que, de certa forma, me apresentou aqueles dois. E, em 27 de agosto, na maternidade de Nossa Senhora de Fátima, tiraram meu cordão umbilical, não perguntaram se eu queria levá-lo de lembrança e, aparentemente a contragosto, eu vim a esse mundo.
Sim, eu sei, é óbvio. Eu sou um herdeiro daquela tradição literária, certo? Uma união entre o estilo do Nelson, a inventividade do Borges e os impulsos do Leminski. Nenhum astrólogo me provou isso ainda, mas vou encontrar um. Correndo o grande risco dele ver uma coincidência comprometedora. Porque, também no dia 24 de agosto, o Paulo Coelho resolveu atrapalhar esta perfeita harmonia cósmica e nascer no berço ao lado. Ou seja, por um fio da eternidade, eu posso ser um escritor brilhante ou um medíocre que se acha escritor.
Mas voltemos às coincidências mais convenientes. Este mês será publicada minha matéria sobre os 80 anos do Leminski, o que é um orgulho profissional. Para escrevê-la, reli a biografia do Toninho Vaz que, em um dos capítulos finais, fala do incêndio que ocorreu no Instituto Neo-Pitagórico, dia 24 de agosto de 1987. O poeta, e aniversariante do dia, costumava frequentar bastante o lugar. Depois de ter lamentando o ocorrido, deve ter se espantado com outra coincidência. Foi exatamente na famosa “Noite de São Bartolomeu”, quando uns séculos antes, protestantes foram massacrados, ali onde hoje estão fazendo as Olimpíadas.
E, agora, só mais um passo cuidadoso pelas coincidências macabras. Falei do meu aniversário com a zeladora, a pessoa que mais conversa com o “André do 405”. Ela arregalou os olhos, ergueu a mão, convidando ao “high five”, disse que também faz este mês e perguntou o dia. Mas se decepcionou, tanto, que baixou os olhos ao chão. É o mesmo dia que seu irmão, falecido, tinha nascido. “Que Deus o tenha” e ela disse “Amém”.
“Amém” também digo a Santo Agostinho, que morreu neste mês, e escreveu o livro que mais influenciou o Nelson. Assim também digo a sua mãe, Santa Mônica, que me abençoa no dia em que nascemos. Porque vou precisar mesmo, até porque agosto começou como uma noite. Muita coisa precisa acontecer para setembro amanhecer. Mas, como diz o poeta, não discuto com o destino e o que pintar eu assino.